segunda-feira, 30 de abril de 2012

A vontade é a raiz da conduta humana

“a vontade é a raiz metafísica do mundo e da conduta humana; ao mesmo tempo, é a fonte de todos os sofrimentos.”

Segundo Schopenhauer, ao tomar consciência de si, o homem se experiencia como um ser movido por aspirações e paixões. Estas constituem a unidade da Vontade, compreendida como o princípio norteador da vida humana. Voltando o olhar para a natureza, o filósofo percebe esta mesma Vontade presente em todos os seres, figurando como fundamento de todo e qualquer movimento. Para Schopenhauer, a Vontade corresponde à Coisa-em-si; ela é o substrato último de toda realidade.

O impulso do desejo, não se da de forma consciente , ele ao contrário, se desdobra desde o inorgânico até o homem, que deseja sua preservação. A consciência humana seria uma mera superfície, tendendo a encobrir, ao conferir causalidade a seus atos e ao próprio mundo, a irracionalidade inerente à vontade. Sendo deste modo compreendida, ela constitui, igualmente, a causa de todo sofrimento, uma vez que lança os entes em uma cadeia perpétua de aspirações sem fim, o que provoca a dor de permanecer algo que jamais consegue completar-se. Segundo tal concepção pessimista, o prazer consiste apenas na supressão momentânea da dor; esta é a única e verdadeira realidade.

Contudo, há alguns caminhos que possibilitam ao homem escapar da vontade, e assim, da dor que ela acarreta. A primeira via é a da arte. Schopenhauer traça uma hierarquia presente nas manifestações artísticas, na qual cada modalidade artística, ao nos lançar em uma pura contemplação de Idéias, nos apresenta um grau de objetivação da vontade. Partindo da arquitetura como seu grau inferior, ao mostrar a resistência e as forças intrínsecas presentes na matéria, o último patamar desta contemplação reside na experiência musical; a música, por ser independente de toda imagem externa, é capaz de nos apresentar a pura Vontade em seus movimentos próprios; a música é, pois, a própria vontade encarnada. Tal contemplação, trazendo a vontade para diante de nós, consegue nos livrar, momentaneamente, de seus liames.


A arte representa apenas um paliativo para o sofrimento humano. Outra possibilidade de escape é apontada através da moral. A conduta humana deve voltar-se para a superação do egoísmo; este provém da ilusão de individuação, pela qual um indivíduo deseja, constantemente, suplantar os outros. A compreensão da Vontade faz aparecer todos os entes desde seu caráter único, o que leva, necessariamente, a um sentimento de fraternidade e a uma prática de caridade e compaixão.


"O motor principal e fundamental no homem, bem como nos animais, é o egoísmo, ou seja, o impulso à existência e ao bem-estar. [...] Na verdade, tanto nos animais quanto nos seres humanos, o egoísmo chega a ser idêntico, pois em ambos une-se perfeitamente ao seu âmago e à sua essência.
Desse modo, todas as acções dos homens e dos animais surgem, em regra, do egoísmo, e a ele também se atribui sempre a tentativa de explicar uma determinada acção. Nas suas acções baseia-se também, em geral, o cálculo de todos os meios pelos quais procura-se dirigir os seres humanos a um objectivo. Por natureza, o egoísmo é ilimitado: o homem quer conservar a sua existência utilizando qualquer meio ao seu alcance, quer ficar totalmente livre das dores que também incluem a falta e a privação, quer a maior quantidade possível de bem-estar e todo o prazer de que for capaz, e chega até mesmo a tentar desenvolver em si mesmo, quando possível, novas capacidades de deleite. Tudo o que se opõe ao ímpeto do seu egoísmo provoca o seu mau humor, a sua ira e o seu ódio: ele tentará aniquilá-lo como a um inimigo. Quer possivelmente desfrutar de tudo e possuir tudo; mas, como isso é impossível, quer, pelo menos, dominar tudo: 'Tudo para mim e nada para os outros' é o seu lema. O egoísmo é gigantesco: ele rege o mundo.

Arthur Schopenhauer, in 'A Arte de Insultar'